quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Morte
Arredado por mão não sabida, arrepiava fácil e xingava a vida. Ele ia e vinha sem rumo. Arrancava folhas das plantas, chutava o chão, limpava os olhos sem parar e fechava com tal ênfase as mãos que fincava na pele as unhas. Era de dor graúda a feição do caboclo. Pausadamente subira-lhe o amargo à alma. Ela, inocente, dera boas vindas a cada leva de fel, disfarçado que vinha de romance. Amara errado e dera de si tudo, a cada amor. Agora, esse último, sabendo que, sofrido fazia-se inda mais carente o moço, veio com tudo. Limpou o terreno, espantou os agregados, fechou os portões e mandou feio no coração do besta.
Bela, novinha, sabida das artes de fazer cativos, quente nas carnes, suave na conversa, achada que fora numa sala de bate-papo, ela era encomendada para o desastre.
Sentindo-se amado muito, negaceava para escapulir de quem abrir os seus olhos tentasse. Entregue ao capricho dela, foi dilapidado de bens e de respeito próprio.
Na antevéspera daquela noite, dera de si de espiar o que fazia a moça no quarto do jardineiro e vira o que não queria. Dele tinha o membro na mão, imenso, vibrando no pulsar das veias intumescidas ao limite. Tinha no rosto tal rito de prazer que parecia fora de si a menina. O sorriso safado do cara encorajava os movimentos da mão dela. Com as pontas dos dedos alisava a glande, e enfiava o mindinho no buraquinho do membro. Cada detalhe, mil comparações, desejos reprimidos pela presunção de pureza da moça, leitura do que ia grafado como argumentos irrefutáveis, dos corpos engajados naquela surpresa gravada na sua alma. Ficara ali vendo e morrendo. Às vezes, ver mata. O gozo do jardineiro veio pelos cantos da boca dela.
Cuidadoso, saiu sorrateiro para não denunciar sua morte.
Tomava seu chá vespertino quando ela chegou e beijou-lhe demoradamente os lábios, lambendo-os como era de seu feitio. A mistura do adstringente do chá com o salubre do esperma, fez em sua boca o sabor mais indecente. Sabia à morte esse beijo. Ele correspondeu intensamente, abrindo-se à sua última paixão. Foi com ela para a cama e rolou o sexo mais gostoso desde que a conhecera. Fizeram planos para o futuro. Ela saiu para a cidade com o motorista, rapaz de confiança dele. Agora, acudia ao homem que ela olhava longamente o entremeio dos que vieram fazer o teste para o emprego e desse, via enfim, essa visão de morte, era notável o volume. Troncudo, cadeiras largas, nos seus trinta, cachos caindo na nuca, ele mais dançava que andava enquanto mimava a “madame”.
Ela foi comprar um presente para o seu aniversário. Fazia hoje cinqüenta anos... Ela tinha vinte. Mais gostosa que nunca essa morte.

Onaldo A Pereira

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